Pronto, não foi uma semana, foram apenas seis dias. E ainda bem, porque já não aguentava viver nem mais um dia sem o meu livre arbítrio.
Digo isto com muita pena, mas no que diz respeito a roupa de mulheres, o meu pai é igual à maioria dos homens. Não sabe fazer conjugações, não tem a mínima noção de como escolher sapatos e acha que é normal juntar um macacão preto com umas botas militares que está tudo bem.
O desafio começou na terça-feira passada, dia 10, e prolongou-se penosamente até à terça-feia seguinte, 17. Durante todos estes dias, exceto ao fim de semana, o meu querido pai desarrumou o armário, tirou tudo cá para fora, os sapatos ficaram espalhados pelo chão do quarto e as gavetas foram totalmente remexidas. Claro que, no final, tinha de se eu a arrumar tudo de novo. A história repetiu-se todas as noites, quando ele decidia o que eu devia vestir na manhã seguinte.
O meu pai tem 54 anos, é perito de automóveis e as únicas ligações que tem com moda vêm de mim e da minha mãe. Mesmo assim, sempre achei que ele era um homem com gosto. É típico andar sempre com camisas de tons monocromáticos ou com riscas finas verticais, as calças têm sempre um corte direito e a ganga é especialmente usada durante o fim de semana. Gosto disso.
Vamos esclarecer uma coisa: eu nunca, mas mesmo nunca, lhe dei nenhuma dica, fiz qualquer comentário ou careta enquanto ele escolhia a roupa
Mas, atenção, ele é muito crítico em relação à minha roupa. Ainda há umas semanas, quando fui ter com ele à Zara e estava vestida com as minhas boyfriend jeans rasgadas nos joelhos, ele disse-me: “Mas que raio de calças são essas? Não gosto nada de ver”. Fiquei muito triste com este comentário.
Todos os domingos, depois do almoço, eu, a minha mãe, o meu pai e a minha avó sentamo-nos no sofá e cada uma tem uma revista na mão. O meu pai fica-se pelo jornal. Quando acaba, gosta de dar uma “vista de olhos” nas minhas revistas de moda.
Eu gosto de acreditar que tenho influêcia no bom gosto que mostra quando se veste. E devo dizer que o meu pai veste-se realmente bem (na empresa onde ele trabalha, os colegas dizem que é o perito mais bem vestido, por isso não é brincadeira).
Mas vestir mulheres é completamente diferente. E ele precisa de muito mais aconselhamento. Num dos dias, foi buscar umas calças largas que eu usava para ir para a praia (“usava” é a palavra certa, já nem me lembrava de que as tinha no armário) e conjugou-as com uma camisa cor de rosa e uns botins bordeaux.
Naquele dia pensei, sinceramente, que não ia ser capaz de sair de casa daquela maneira e que tinha de levar a roupa na mala para a vestir na redação. Por sorte, ele acabou por desistir do look.
Vamos esclarecer uma coisa: eu nunca, mas mesmo nunca, lhe dei nenhuma dica, fiz qualquer comentário ou careta enquanto ele escolhia a roupa. Todas as peças que aparecem nas fotos foram escolhidas exclusivamente pelo meu pai.
Ainda assim, acho que este artigo acabou por ser mais doloroso para a minha mãe. Ela morreu de inveja por não ter sido ela a escolhida para fazer o artigo. “Mas porque é que não pode ser a mãe a escolher? Podes fazer outro artigo em que eu entre?”. Sim, ela perguntou-me mesmo isto. Tal como eu, ficou chocada com muitas das escolhas do meu pai porque “ele está sempre a criticar e depois não muda nada”. Acho que a minha mãe continua à espera da vez dela — vou pensar noutro artigo deste género.
O balanço diria que foi engraçado. Não um sucesso. Custou-me vestir coisas que já nem me lembrava de que existiam. Seja como for, acho que o meu pai até se safou. Foi um orgulho, como sempre.
Carregue na imagem acima para ver os looks de cada dia com os comentários do meu pai.