Aos 18 anos, Billie Eilish é uma das artistas com mais sucesso do momento. Na edição dos Grammys deste ano, que aconteceu a 27 de janeiro, nos Estados Unidos, foi a estrela da noite, com cinco prémios no currículo. Em Portugal, esgotou a Altice Arena em poucas horas, e o cenário repetiu-se em vários países. Embora seja vista como uma artista confiante em palco, a jovem esconde um passado frágil, que está agora a revelar ao mundo.
A americana é a protagonista da capa da edição de março da revista “Vogue” norte-americana, onde dá uma entrevista, também disponível no site da publicação, sobre a sua vida. Desde a relação tóxica com o seu corpo à baixa auto-estima que prejudicou a sua saúde mental, falou sem receios.
“Eu simplesmente odiava o meu corpo. Teria feito qualquer coisa para estar num corpo diferente“, disse. Entre as várias razões, culpa a puberdade que chegou demasiado cedo.
“Queria ser modelo, mas era gordinha e baixa. E desenvolvi-me muito cedo. Já tinha seios aos nove anos. Tenho menstruação desde os 11. Então, o meu corpo estava a ir mais rápido do que o meu cérebro. É engraçado, porque, quando se é criança, nós nem pensamos no corpo e, de repente, olhamos para baixo e fica-se tipo: ‘Wow. O que posso fazer para que isso desapareça?’”, revelou.
A relação com o seu corpo tornou-se tão complicada que Billie chegou mesmo a pensar no suicídio.
“Quando as pessoas me perguntam o que eu diria a alguém que procura conselhos sobre saúde mental, a única coisa que posso dizer é: ‘Paciência’. Tive paciência comigo mesma. Não dei o último passo. Esperei. As coisas desaparecem.”
Na mesma entrevista à “Vogue”, publicada no site a 3 de fevereiro, mas que só agora está a merecer atenção internacional, fala da sua infância, altura em que tudo começou.
Aos 12 anos, surgiram os primeiros sintomas de dismorfia corporal — um transtorno mental caracterizado pela distorção da auto-imagem. Seguiu-se a depressão, que associa a uma lesão contraída na dança, um grupo de amigos tóxicos e um relacionamento romântico com alguém que a tratou mal. Mas, acima de tudo, estava magoada com a sua aparência.
Naquela altura Billie Eilish fazia parte de um grupo de dança de competição e tinha de usar frequentemente roupas justas que a deixavam desconfortável. Aos 13 anos, uma lesão no quadril obrigou-a a interromper a sua carreira na área.
Numa entrevista à revista “Rolling Stone”, em setembro de 2019, revelou que foi nessa fase que começou a depressão. “Isso levou-me para um buraco. Passei por uma fase de auto-mutilação — não precisamos de entrar por aí. Mas a essência disso era que eu sentia que merecia dor”.
“Há dois anos, senti que nada importava. Tudo era inútil. Não só na minha vida, mas no mundo inteiro. Estava totalmente deprimida clinicamente. É uma loucura olhar para trás e não estar mais assim”, contou.
Após falar da doença, foi acusada nas redes sociais de fazer declarações falsas, o que levou a cantora a mostrar-se magoada.
“Era uma miúda de 16 anos bem instável. Estou no lugar mais feliz da minha vida, e eu nem achava que chegaria a essa idade.” E continua: “Não achava que podia ser feliz novamente. E aqui estou. Cheguei a um ponto em que finalmente estou OK. Não é porque sou famosa. Não é porque tenho um pouco mais de dinheiro. São tantas coisas diferentes: crescer, pessoas a entrar na minha vida, certas pessoas a deixar a minha vida.”
Em dezembro de 2019, no “CBS This Morning”, falou do facto de vestir sempre roupas largas, uma decisão que, embora parecesse apenas uma tentativa de ditar uma tendência de moda, estava relacionada com a forma como se sentia desconfortável com o seu corpo.
“O relacionamento com o meu corpo tem sido o mais tóxico que pode imaginar”, explicou. “A maneira como me visto tornou esse relacionamento muito melhor. É menos sobre o ‘meu corpo é feio, não quero que veja’, e mais sobre ‘não me sinto confortável a usar isto, estou confortável a usar isto.”
Foi também nessa entrevista que Billie revelou ter pensado em pôr fim à própria vida: “Pensei nisso uma vez, em Berlim. Estava sozinha no hotel e lembro-me de que havia uma janela ali. Estava a chorar e a pensar sobre a forma como podia morrer, eu ia mesmo fazê-lo.”
Gayle King, a apresentadora do programa da CBS, perguntou o que a fez parar e Billie respondeu: a mãe. Em junho de 2019, cantora decidiu procurar ajuda e começou a descobrir formas de cuidar da sua saúde mental. Passou por terapia e privilegiou o tempo com os amigos e a família. Até andava a cavalo.
A mãe de Billie, Maggie Baird, disse a Gayle que também foram os fãs e os espetáculos que ajudaram a cantora a continuar. Agora, Billie fala disso nas suas músicas e tenta ajudar quem a segue a ultrapassar este problema.
“Apenas os agarro pelos ombros e fico tipo: ‘Por favor, cuida-te e sê bom e gentil contigo mesmo. Não dês esse passo extra [o suicídio].”
Como começou a carreira de Billie Eilish?
Nasceu em 2001 em Los Angeles e começou a cantar quando ainda era muito nova — fazia parte de um coro infantil local desde os oito anos. Aos 11 já estava a compor canções. Sempre foi muito influenciada pelo irmão mais velho, Finneas O’Connell, que tinha uma banda e com quem ainda costuma colaborar na composição das músicas (e nos concertos).
Ambos cresceram a ter aulas em casa — nunca passaram pela escola — e foram criados como vegetarianos.
O seu primeiro single, “Ocean Eyes”, foi escrito por Finneas — era suposto ser uma canção para a sua banda — e foi lançado em 2016 na plataforma SoundCloud. Billie Eilish, que também dançava desde cedo, enviou a canção para o seu professor de dança para que preparasse uma coreografia para o tema — foi essencial para o sucesso do videoclip.
Um ano depois, lançou o primeiro EP, “Don’t Smile at Me”. Chegou aos lugares de topo de vendas nos EUA, Reino Unido, Canadá e Austrália e começou a conquistar milhões de fãs em todo o mundo através da Internet. O seu mundo é este: o digital, o das redes sociais.
A partir daí, começaram as colaborações com outros músicos. Uma delas foi com Khalid, que resultou no single “Lovely”, que saiu em abril de 2018 e foi incluído na banda sonora da segunda temporada da série da Netflix “Por Treze Razões”.
O seu primeiro e único álbum até agora chama-se “When We Fall Asleep, Where do We Go?”. Chegou às lojas em março de 2019 e conquistou de imediato o primeiro lugar no ranking dos mais vendidos e ouvidos nos EUA — desta forma, Billie Eilish tornou-se a primeira artista nascida nos anos 2000 a conseguir este feito.
Entre os seus singles mais conhecidos estão “Bad Guy”, “Bury a Friend”, “When I Was Older” ou “Wish You Were Gay”. Nesse ano, deu um dos principais concertos no conceituado festival de Coachella, no deserto californiano.
Numa entrevista com a revista “Paper”, Billie Eilish disse que a coisa mais difícil que teve de ultrapassar — e que está presente em muitas das suas músicas — foi uma relação com um rapaz que correu mal.
“Eu não passei por muitas coisas terríveis. Penso que a maior delas, sobre a qual tenho escrito bastante, é um rapaz que me destruiu bastante. Ele foi a minha vida durante um ano — e foi muito difícil. As pessoas dizem que ‘foi apenas um rapaz’, mas teve um enorme efeito em mim. Estava sempre distraída por causa disto. Ele era terrível e tratava-me mal. Escrevi milhões de canções sobre ele.”
Entre várias distinções, já venceu três prémios da MTV na cerimónia dos VMA — Video Music Awards e, mais recentemente, cinco prémios nos Grammys.