Ir ao ginásio não é um hábito exclusivo das pessoas novas. Correr, ter aulas de zumba ou fazer TRX também está na moda entre pessoas com mais idade. Cansam-se mais depressa, têm menos força, mas nunca desistem. O maior inimigo? O conforto do sofá.
A NiT esteve em três ginásios de Lisboa —Holmes Place da Quinta da Fonte, em Oeiras, no Virgin Active e Fitness Hut Amoreiras —para acompanhar os treinos dos sócio mais velhos de cada. Conheça as suas história e veja o vídeo dos treinos na NiTtv.
Maria Cesaltina Proença, 85 anos
Há dias em que correm três gerações, lado a lado, na passadeira de ginásio. Cesaltina, 85 anos, a filha Margarida de Bree, 45, e o neto João, 21.
“Eu corro a par dos meus netos”, conta à NiT, orgulhosa, Maria Cesaltina Proença, sócia do Holmes Place da Quinta da Fonte, desde 2013. Ela treina quatro vezes por semana,desde os 76 anos — diz que o exercício físico é uma actividade imprescindível na sua vida.
“É um passatempo maravilhoso. Saio daqui com a cabeça desanuviada e sinto que o corpo corresponde aos exercícios que faço. Sinto-me nova quando saio do ginásio”. Maria Cesaltina Proença entra na sala do ginásio com as costas direitas como se fosse uma mulher de 20 anos. Dirige-se para a passadeira e começa a andar. Depois corre (sim, corre) a uma velocidade de sete quilómetros por hora. Mantém a velocidade durante três minutos antes de reduzir o ritmo de novo para passeio. O exercício dura mais 15 minutos. Trabalha em part-time como enfermeira, a profissão que ocupou a sua vida inteira.
“Eu se tivesse em casa não estava assim. Estava sentada ou deitada no sofá a ver telenovelas à espera que a morte chegasse, como a maioria faz”
“Eu se tivesse em casa não estava assim. Estava sentada ou deitada no sofá a ver telenovelas à espera que a morte chegasse, como a maioria faz”, conta à NiT. “Enquanto tiver vida vou aproveitá-la o melhor possível.” Quando vai para o ginásio, vai sozinha a conduzir. O marido já morreu.
Os treinos duram entre 1h30 e duas horas. O plano foi preparado por um personal trainer. A dona Cesaltina treina sempre sozinha e, muitas vezes, improvisa os exercícios para não cair na monotonia. O plano inclui o aquecimento na passadeira e máquinas de musculação de braços e pernas. Mas ela quer ainda mais, por isso faz, por sua iniciativa, agachamentos, lunges e exercícios com a bola suiça que aprendeu nas aulas de pilates. Ela adora as aulas de grupo, especialmente as de bodybalance, zumba, bodycombat e cxwork. Experimentou antigravity, mas já achou tanta piada: “É muito parada.”Entre os treinos e o trabalho, o tempo que lhe resta é passado com a sua grande família: cinco filhos e 15 netos.
Otília Marques, 67 anos
“Às vezes estou com pessoas mais novas a subir uma rua e elas queixam-se de que estão cansadas. A minha resposta é sempre a mesma: ‘Vá lá, mexe-te’”, conta Otília Marques, sócia do ginásio Virgin Active. “Fui bancária durante 41 anos, portanto estive 41 anos sentada”.
Reformou-se em 2010. Foi nesta altura que começou a treinar, queria “pôr o corpo a mexer e não se acomodar ao sofá”. Os resultados são evidentes: “Sinto imensas diferenças, tanto de cabeça—é ótimo porque nos esquecemos de tudo o resto quando cá estamos — , mas no corpo também. É muito bom porque vamos buscar a roupa antiga ao armário, serve e ficamos satisfeitíssimos”.
Durante o treino, Otília Marques olha muito para um relógio que tinha no pulso. Em vez de contar o tempo, este aparelho mede os batimentos cardíacos: “Um dia fui ao médico porque andava com a tensão alta e descobri que tinha um aneurisma”. Sempre que o relógio atinge as 140 batidas (não devia passar das 120), Otília para para descansar durante alguns segundos. Depois retoma o exercício.
“Fui bancária durante 41 anos, portanto estive 41 anos sentada”
O médico disse-lhe que não fazia mal: “O que interessa é que se sinta bem”.Uma vez por semana, Otília é acompanhada pelo personal trainer Miguel Barradas. O treino começa com uma caminhada na passadeira, onde é feito um “pequeno briefing sobre o estado físico de Otília nos últimos dias”, conta o PT. No final da conversa, saem da passadeira, trabalham os membros inferiores numa máquina de pilates (a reformer) e seguem para máquinas de musculação. Depois há TRX e remo. O treino acaba com Otília Marques a empurrar uma caixa de 40 quilos que serve para “desenvolver e estimular a motivação”, explica Miguel Barradas. Quando treina sozinha, faz treino cardiovascular na passadeira e no remo.
“Agora tenho de ir ao Museu Nacional de Arte Antiga, porque está lá a exposição da Josefa de Óbidos”, conta Otília. O único neto é o seu “compincha”, que vai buscar quase sempre à escola. A dona Otília, como é tratada no ginásio, tem outro prazer: “Adoro sair do ginásio e meter-me no carro para ir para casa. Adoro guiar, especialmente na cidade”. Otília tem muito cuidado com a alimentação, mas não por uma questão de saúde. Preocupa-se com a linha e segue uma dieta rigorosa.
“Estou-me a portar melhor agora porque quando for embora [vai de férias para Espanha] quero comer um churro por dia”. Miguel Barradas, que estava a ouvir a conversa, gritou logo: “Dona Otília, eu estou a ouvir isso”.
Pedro Coelho, 74 anos
Pedro Coelho está a meio do treino quando olha para o repórter de imagem da NiT e diz: “Durante um verão fui o segundo assistente de realização num filme em que entrava a Amália Rodrigues”. A história aconteceu em 1962, no ano da greve académica. Nesta altura, Pedro Coelho tinha 20 anos e costumava frequentar o café Váva, na Avenida de Roma, em Lisboa, “com o grupo do cinema”, como lhe chamou. “Estava lá o César Monteiro, o António Pedro Vasconcelos e essa malta toda”, conta. “Certo dia chegou lá um rapaz que andava à procura de malta para trabalhar num filme e perguntou-me se eu queria entrar”. O filme chama-se “As Ilhas Encantadas” e foi rodado em Porto Santo, na Madeira.
Coelho nasceu, casou, trabalhou, teve filhos e viveu toda a vida em Lisboa. Foi farmacêutico de profissão e Secretário de Estado da Emigração, entre 1974 e 1975 (logo depois da Revolução), e da Pesca, entre 1975 e 1979. Além disso, sempre jogou ténis e futebol.
“É uma pessoa cheia de energia e muito bem disposta. Dá pica treinar com pessoas assim”
Ésócio da cadeia low-cost Fitness Hut, onde treina duas vezes por semana durante uma hora, sempre acompanhado pelo personal trainer Jorge Galamba. “É uma pessoa cheia de energia e muito bem disposta. Dá pica treinar com pessoas assim”, conta o PT. O Sr. Coelho reformou-se em 2012, mas ainda não se habitou à vida sem rotina. Para contrariar isso, além do treinos no ginásio, ainda joga golf, faz jardinagem, bricolage, lê e ouve muita música. “Oiço com mais frequência a clássica, mas claro que também há os Beatles ou os Queen, que são tipos fantásticos.”
Desde que se inscreveu no ginásio, já notou várias diferenças no corpo. Tem os braços mais fortes e deixou de estar “permanentemente grávido”, como ele costuma dizer numa alusão à sua barriga. O seu treino divide-se numa vertente cardiovascular (feita na passadeira, remo e bicicleta) e de musculação, onde o PT interfere e ajuda nos exercícios. Há cuidados obrigatórios: o peso que utiliza nos exercícios tem de ser controlado e, quando está a fazer exercícios deitado no tapete, tem de ter cuidado ao mudar de posição por causa das lesões antigas nas costelas. “Se tiver o azar de me magoar, posso ficar lesionado outra vez”.