Alexandre Machado, Eduardo Torgal, Cris Carvalho e Fernando Mesquita. Estes são os quatro especialistas que definem os matches — que fazem os pares — entre todos os candidatos de “Casados à Primeira Vista”, programa da SIC que foi um enorme sucesso no ano passado e que arrancou agora para uma segunda temporada.
O formato regressou à televisão no domingo, 13 de outubro, e a estreia foi vista por mais de um milhão e 300 mil pessoas. Os protagonistas são outros, mas os objetivos serão os mesmos: encontrar o amor ao casar com um desconhecido.
A lógica é que os especialistas conseguem definir bem os perfis psicológicos e de personalidade de cada participante para juntar pessoas que são compatíveis e que se complementam. Da primeira temporada não sobrou nem um casal junto, mas em conversa com a NiT, Alexandre Machado defende que foi um sucesso à mesma — até porque essas pessoas desenvolveram competências que agora usam fora do programa.
O neuropsicólogo e analista comportamental explicou ainda que medidas tomaram para que os casais tivessem uma melhor experiência desta vez, contou quais serão os principais desafios de cada casal (dos que conhecemos até agora) e revelou que não fazia ideia de que Marta e Luís já se conheciam antes. Leia a entrevista da NiT.
Qual foi a grande motivação para fazer esta segunda temporada?
Estou sempre motivado para ajudar as pessoas, o meu trabalho é ajudar. Aqui, tenho a oportunidade não só de ajudar as pessoas que estão no programa, como as que ouvem os conselhos, os métodos e os especialistas em casa.
Houve alguma coisa na primeira temporada que não tenha corrido bem e que tenham feito um esforço para mudar nesta segunda?
Temos sempre de olhar para isto como um processo construtivo. Nunca há nada que corre mal, há é coisas que podemos otimizar, mas nada correu realmente mal. Por exemplo, otimizámos os métodos de avaliação para que tivessem mais em consideração a desejabilidade social para termos pessoas ainda mais emergidas naquilo que é a experiência do programa.
E foi difícil encontrar essas pessoas que queriam mesmo esta experiência? Ou este ano até foi mais fácil porque já existia um histórico?
Não, no ano passado também foi fácil de encontrar. A questão é que às vezes a reação das pessoas à experiência em si é algo que não conseguimos prever, por causa da própria natureza humana. O ser humano é imprevisível, não é? Mas de certa forma tentámos encontrar pessoas que tivessem uma maior resistência durante a experiência, com mais tolerância à frustração e a todos os entraves que por vezes se encontram em relações neste contexto.
Pensa que conseguiram encontrar pessoas diferentes dos candidatos da primeira temporada?
Já sabíamos que íamos encontrar pessoas diferentes porque não há ninguém igual — se fizermos outra temporada também havemos de encontrar pessoas diferentes. Mas na grande amostra que tínhamos, encontrámos pessoas que estavam efetivamente empenhadas em estar numa relação, a encontrar o amor neste tipo de experiência.
É essa a grande diferença em relação aos participantes da primeira temporada?
Não, os da primeira temporada também queriam encontrar o amor. Podem é ter reagido de uma forma diferente quando estavam dentro da experiência. Os fatores podem ser vários: por exemplo, o facto de se verem a si próprios na televisão. De se terem visto na experiência enquanto estavam na experiência. Neste caso isso não aconteceu, e poderá ter tido alguma influência.
Este ano fizeram isso de propósito, para as pessoas não se verem na televisão enquanto estavam a fazer o programa?
É como se faz num laboratório. Todas as dimensões que achámos que podiam enviesar o resultado final, tentámos blindá-las para que os casais tivessem mais qualidade na experiência. E tentámos encontrar pessoas cujo meio social não tivesse uma grande influência nas suas tomadas de decisões. Sabíamos que a dada altura deixavam de estar a viver a experiência, para viverem uma experiência mediada pelas pressões externas. E tentámos evitar isso.
Mas já terminaram as gravações, nesse caso?
Não, ainda há coisas que temos de gravar, mas é menos do que no ano passado.
Houve alguma surpresa para os especialistas com o desenrolar da primeira semana?
Não, as reações que eles tiveram foi exatamente aquilo que esperávamos. Todos eles reagiram exatamente como esperávamos. Sabíamos que a Inês ia de alguma forma acomodar mais as suas emoções, ia receber o noivo de uma forma mais aberta. E sabíamos que a Ana Raquel ia ver a relação só pelo buraco de uma fechadura, ia olhar só para os defeitos do noivo, e esse era o desafio dela, porque foi isso que falhou nas outras relações.
Mas estavam mesmo à espera que ela reagisse assim, que dissesse o que disse?
A forma como ela falou são opções dela, não avaliamos se falam de uma forma rude ou não. Mas sabíamos que ia só olhar para os defeitos porque ela é muito focada no aspeto da idade e do físico. Mas a nossa esperança é que esse desafio seja superado e que ela possa mudar o padrão dela, que foi algo que causou muita dor no passado.
A Ana Raquel era quem tinha o maior desafio, de todos os noivos?
Não, ela tem um desafio tão grande quanto a Inês. Só que a forma de elas se expressarem e mediarem esse conflito interno é que é diferente. A Inês espera para ver, tenta ver outras dimensões e características do parceiro que está ao lado dela para encontrar o lado bom. A Ana Raquel é muito mais centrada nos defeitos, tem um padrão de insatisfação. Mas o padrão que ela tinha, em que olhava para as coisas pela embalagem, também lhe causava mais dor.
Alexandre Machado é neuropsicólogo e analista comportamental.
E em relação aos noivos delas, o Hugo e o Paulo, qual serão os seus grandes desafios?
De uma forma geral, estavam muito abertos para a experiência, não criaram grandes expetativas, não fizeram grandes exigências além daquelas básicas, do ponto de vista físico. E receberam as noivas tranquilamente. Em geral os homens são mais abertos, não são tão exigentes, e isso viu-se aqui também. Olham primeiro para o lado bom e aceitam mais as pessoas como elas são.
Por exemplo, o Hugo tinha pedido especificamente uma mulher morena, mas vocês fizeram um match com a Inês, que tem o cabelo loiro. Nestes casos não cedem à vontade dos participantes?
De todo. Não temos em consideração esses fatores sócio-culturais que muitas vezes são transitórios. Temos em consideração o perfil comportamental e psicológico daquela pessoa. Obviamente que se alguém pede uma pessoa magra, não vamos pôr uma pessoa forte. Mas esse tipo de características — pedirem por olhos verdes ou azuis —, sabemos que são coisas que se diluem com uma boa personalidade. Não são essenciais.
A Liliana e o Pedro aparentam ser o casal com melhor início no programa, mas existe o passado que atormenta a Liliana.
Tenho reparado nos comentários que pelo facto de se terem envolvido fisicamente logo no primeiro dia que significa que se estão a dar melhor, mas não é nisso que nos devemos focar. Há pessoas que têm outro timing. Do ponto de vista físico eles tiveram uma grande compatibilidade, mas também acho que foi demais. A forma como se entregaram logo naquele primeiro dia foi demais, demonstrou algum desequilíbrio emocional.
Qual é o grande desafio para eles?
A Liliana casou com uma aliança de um ex-namorado no dedo. Muitas vezes os desafios em relações não é segurar o que é novo, mas largar o que é antigo. Temos muitas dificuldades. Às vezes voltamos a agarrar-nos a pessoas que já conhecemos, mesmo que não tenham sido benéficas para nós. Para se entregar nesta relação, ela tem de largar o passado. Se não, nunca se vai conseguir entregar ao Pedro. E isso não é justo para ele, para o Pedro viver com aquela sombra, se é que vai viver.
Em relação à Marta e ao Luís, vocês já sabiam que eles se conheciam antes?
Não, foi uma surpresa para nós também. Eles conheceram-se através de uma daquelas aplicações de encontros, mas deve ter sido uma situação chata para eles.
Isso mudou muito a vossa perceção deste casal, o facto de eles já se terem conhecido antes do programa?
Não, a única coisa que nos diz é que do ponto de vista físico combinaram um encontro. Mas o nosso método é muito mais rigoroso. Porque as pessoas nessas aplicações só mostram o que querem apresentar. E quando nós avaliamos e apresentamos ao outro, não é aquilo que a pessoa quer mas aquilo que ela precisa naquele momento. Mas mesmo que a experiência não corra bem, e vimos isso no ano passado, vai ter um processo positivo. Os que no ano passado não conseguiam manter uma relação estão em relações. Acho que a Eliana vai casar, a Lídia também… está tudo em relações. As coisas ficam lá só que às vezes o tempo que as pessoas demoram a aceitar aquilo que lhes é dito pode demorar mais. A semente fica lá. No caso da Marta e do Luís o facto de eles já se conhecerem não valida nem acrescenta nada à nossa avaliação.
O especialista acredita que Pedro e Liliana mostraram um desequilíbrio emocional.
Qual será o maior desafio para eles?
Serão os padrões que a Marta tem do passado. Ela ligava-se muito às pessoas pela imagem e magoava-se muito nas relações, porque são todas baseadas num protótipo sócio-cultural que ela estabeleceu. A Marta queria ter uma grande aceitação dos outros, dos amigos, da família. Então procurava o padrão que esses outros iriam aprovar. E nunca arranjou ninguém que fosse ela que aprovasse, porque provavelmente seria diametralmente oposto daquilo que as amigas dela queriam. Já o Luís tem de ganhar competências sociais e psicológicas para viver com outra pessoa, porque ele é muito individualista, esteve sempre a viver sozinho, com rotinas solitárias e agora tem de acrescentar uma pessoa à vida dele. Vai ter de viver com outra opinião e o Luís tem pouca tolerância à frustração e gosta muito de impor a sua opinião. Vamos ver no que vai dar.
O Alexandre diz no episódio de estreia desta temporada que há uma taxa de divórcios muito elevada em Portugal, de 78 por cento. Na verdade não sobreviveu nenhum casal da primeira temporada, portanto vocês também contribuíram para esse número. Hoje faria os mesmos matches da última temporada?
Sim, sem dúvida. As pessoas precisam de números para tentar enquadrar e justificar os seus comportamentos, e por isso é que acreditamos nos horóscopos, só que nós não somos enquadráveis. Neste caso eu poderia teorizar sobre o que aconteceu, se é o fator experiência, se é a exposição de que eles não estavam à espera. Mas a verdade é que mesmo controlando essas dimensões às vezes as pessoas não se dão uma com a outra. É algo que a ciência não explica e que não tem de explicar. Às vezes as pessoas até podem ficar bons amigos mas numa relação não dá. E isso é algo que não conseguimos explicar. Porque nós fazemos os matches controlando as dimensões que são plausíveis de controlar. Mas não somos deuses, não conseguimos controlar a emoção humana. Tentamos fazer o máximo possível. Nós pegamos numa ponta do saco, mas eles têm de pegar na outra. Esse é o trabalho do casal que não podemos fazer por eles.
Não tem receio de o vosso método perder credibilidade porque não sobreviveu nenhum casal da primeira temporada?
Não. Quando alguém se divorcia, é por incompetência da pessoa? Não, é porque não deu certo naquele momento. Houve um fator humano que causou isso. A relação é um ser orgânico constante. Muitas vezes os fatores que terminam com relações até são externos. Basicamente o que muitos fizeram — e havia pessoas com 40 anos que nunca tinham tido uma relação estável — foi recolher as competências que aprenderam aqui e depois vão encontrar alguém que gostem fisicamente. Há pouco tempo encontrei a Lídia na apresentação de um livro e ela veio agradecer-me: se não tivessem posto aquela pessoa à minha frente, eu não me tinha descoberto. Agora mudou de sítio, de vida, tem outra pessoa. E é uma pessoa totalmente compensada neste momento. Isso é sucesso.
Em termos gerais, acha que esta temporada vai ter mais sucesso que a anterior?
Acredito que a temporada passada foi um sucesso e que esta também vai ser. Porque na minha perspetiva temos pessoas que se desenvolvem, que ganham competências, que tinham os olhos fechados e que agora estão abertos. Isto para mim é sucesso e nesta temporada também está garantido.
As pessoas que veem o programa e que o reconhecem na rua vão falar consigo sobre “Casados à Primeira Vista”?
Sim, vêm falar comigo. Geralmente é só para me cumprimentar, as perguntas que me fazem — e aos outros especialistas — é a nós enquanto maridos num casal. As pessoas têm curiosidade sobre como é que gerimos as nossas relações. Mas normalmente é só fotografias e um cumprimento.
Gostaria de fazer uma terceira temporada?
[risos] Tinha que equacionar na altura, porque já é muito cansativo, não é? Neste momento é muito extenuante e se tivesse de decidir agora, não fazia. Mas mais tarde não sei. Quando acabei a primeira também disse que não fazia a segunda e cá estamos nós.
Leia ainda a crónica do humorista Miguel Lambertini ao episódio de estreia e recorde as frases inesquecíveis de Ana Raquel.