Olhando para a programação da edição deste ano do Rock in Rio Lisboa, não era difícil de adivinhar que este domingo, 24 de junho, seria o mais forte em termos de público — e foi isso mesmo que aconteceu, já que a data foi a única esgotada (pelo menos até agora). 85 mil pessoas encheram o Parque da Bela Vista.
Se uma das grandes atrações era a chegada do furacão Anitta, a estreia da rainha do funk brasileiro, outro, era, claro, o concerto de Bruno Mars, um dos músicos mais ouvidos no mundo na atualidade. Pelo meio, ficava Demi Lovato — que também se estreou em Portugal com este concerto e foi igualmente decisiva para que tantos milhares de pessoas comprassem os bilhetes.
A cantora americana faz parte da vaga de atrizes adolescentes da Disney que se tornaram estrelas pop da música. E é isso que Demi Lovato é, uma estrela — embora, em termos artísticos, isso não lhe valha grande coisa.
No vale do Parque da Bela Vista, foi visível (e deu para ouvir bem também) a quantidade de fãs que a cantora chamou de propósito ao festival: os Lovatics, assim se chamam os seguidores dedicados de Demi Lovato. À medida que cada tema foi interpretado, as primeiras (e eram bastantes) filas da frente cantavam em coro as letras — algumas decoradas há vários anos — batiam palmas e, claro, levantavam bem alto as lanternas dos smartphones quando as baladas o exigiam. Nem foram necessárias quaisquer indicações durante a atuação.
Do outro lado, em cima do Palco Mundo, uma Demi Lovato irrepreensível — como se pede a uma cantora desta dimensão, mesmo que tenha apenas 25 anos. Sucesso após sucesso, ouvimos temas como “Skyscraper”, “No Promises”, “Games”, “Daddy Issues”, “Sober”, “Échame La Culpa” ou “Sorry Not Sorry”, entre vários outros. Os vários bailarinos acompanharam-na em palco, o espetáculo estava obviamente programado ao milímetro e segundo e nada falhou, até estaria apontado o momento certo em que Demi Lovato deveria tirar o casaco com que tinha entrado no palco.
Tudo isto é bom, tudo isto é música pop, tudo corre bem e com uma felicidade meio ingénua — típica das idades mais jovens, que compõem o público de Demi Lovato. A cantora dirige-se, aparentemente surpreendida, à multidão, durante a atuação, para agradecer que saibam as letras de cor e frisar que é a sua grande estreia em Portugal e que não estava à espera de tanta gente. Mas, mais do que música, tudo isto é entretenimento: dança, roupas, efeitos de luzes, pirotecnia — que acaba por ser uma coisa bem diferente.
Pode ser aquilo que o público de Demi Lovato e do Rock in Rio deseja, mas depois de ouvirmos ao vivo a belíssima (e afinada) voz da cantora, que tem talento a sério, só ficamos com pena que não o esteja aproveitar noutros géneros de música, se calhar mais elaborados e sofisticados — Demi Lovato goes soul ou R&B (mas a sério), por exemplo, seria uma boa aposta.
Na música o que importa é a emoção e esta reside no momento de determinado concerto — naquele sítio e horas específicas, por isso é que se gravam álbuns ao vivo —, reside no erro, na experimentação, na característica, na diferença, no irrepetível. Quando tudo é formatado e não há espaço para a espontaneidade e criatividade, tudo isso se perde e se torna nada mais nada menos do que puro entretenimento. Que é uma coisa bem diferente de arte. E na categoria de entretenimento, porque é que Demi Lovato se há de diferenciar de dezenas de outras cantoras e cantores mundialmente famosos por fazerem isso mesmo, executarem uma fórmula simples que entretenha as pessoas?