Nunca é fácil analisar um blockbuster e menos ainda tratando-se de um com super-heróis, pois estes filmes empenham-se muito mais no entretenimento do que em fazer Cinema. Isso não quer dizer que um filme de ação não possa ser um bom filme – a saga “Dark Knight”, de Christopher Nolan, prova isso mesmo – mas é um facto que a indústria dos super-heróis tende a esconder buracos narrativos com efeitos especiais e combates eletrizantes. É precisamente por isso que a análise a estes filmes deve ser arredondada, focando-se mais em aspetos técnicos e nos meios que a produção escolhe para gerar espetáculo. Ora, quando esse espetáculo também falha, deparamo-nos com um grave problema.
Em primeiro lugar, dizer que a ideia para este filme era tremendamente ambiciosa. Aprofundar as consequências sociais da presença de um Deus – o Super-Homem (Henry Cavill) – na Terra exige um argumento complexo. Depois soube-se que também Batman (Ben Affleck) iria desempenhar um papel nesta intriga. E a Wonder Woman (Gal Gadot). E o Lex Luthor (Jesse Eisenberg), o arqui-inimigo da banda desenhada. E talvez o Aquaman, e, quem sabe, o Flash. Ou seja, este “Batman v Super-Homem: O Despertar da Justiça” começa por cometer o mesmo erro de “Homem de Aço”, o primeiro apontamento da saga, ao querer gerir demasiada informação ao mesmo tempo. Isso não é propriamente mau, mas é um risco, e a competência dos argumentistas, Chris Terrio e David S. Goyer, provou-se insuficiente.
Batman e Super-Homem parecem perdidos no caos que é a narrativa e a visão de Snyder
Numa entrevista ao canal “Today Online”, Affleck terá dito que uma das coisas que mais o motivou a integrar-se no filme foi a complexidade da sua personagem. “Ele está em conflito consigo mesmo, incerto sobre qual a coisa certa a fazer.” É verdade, e o mesmo acontece com o Super-Homem – o que poderia estabelecer uma dinâmica interessantíssima entre ambos, onde os heróis se encarariam como vilões. O realizador, Zack Snyder, bem tenta. Batman e Super-Homem defrontam-se violentamente, mas as suas motivações são tão fracas que estes dois colossos da eterna dicotomia entre o bem e o mal parecem perdidos no caos. Tanto no caos que é esta narrativa, como no caos visual que é a visão de Snyder.
Há uma utilização abusiva de CGI e de todos os componentes que normalmente fazem de Hollywood algo espetacular – explosões, coreografias incríveis, planos aéreos alucinantes, monstros gigantes… Mas, então, porque é que este filme é tudo menos espetacular? Porque não há contenção ou sequer nexo. Apesar de não ser um filme íntegro e de qualidade, “Homem de Aço” oferece divertimento, com sequências rapidíssimas e bem filmadas e com bons momentos de ação. É, por isso, incompreensível que “Batman v Super-Homem – um filme com o investimento de 400 milhões de dólares – não consiga construir uma perseguição credível ou um combate impressionante. Nem mesmo a banda sonora – uma pareceria extraordinária entre Hans Zimmer e Junkie XL (“Mad Max: A Estrada da Fúria”) – parece ter sido bem aproveitada, pois Snyder utiliza-a não como um complemento para o ambiente das cenas, mas apenas para exacerbar momentos climáticos.
Robbie Collin, do Telegraph, caracteriza este filme como “o blockbuster mais incoerente dos últimos anos”, e isso é indiscutível. Essa incoerência começa logo com a controversa contratação de Jesse Eisenberg para suceder a Kevin Spacey na representação de um dos vilões mais emblemáticos do universo da DC Comics – supostamente o homem mais inteligente do mundo. A única coisa a dizer sobre a sua presença é que, no mínimo, valer-lhe-á a nomeação ao Razzie – os Oscars dos maus filmes – para pior prestação do ano. Entre tiques nervosos e silabas estridentes, Lex Luthor trocou a sua temível e inteligente excentricidade por um histerismo ridículo. Para mim, que nunca fui ávido consumidor da banda desenhada da DC Comics, este filme é apenas uma triste curva na abordagem à ação de qualidade que Hollywood tem tentado criar. Mas para os fãs, “Batman v Super-Homem” será um insulto.