Numa era em que tudo à nossa volta é digital, faz sentido continuarmos a usar moedas e notas para comprar o que nos apetece? É possível viver apenas com um cartão? Isso é mais ou menos seguro? Consigo poupar dinheiro dessa forma ou acabo por comprar coisas mais caras por não estar a olhar efetivamente para o dinheiro? Foi precisamente para responder a estas e outras perguntas que quatro colaboradores da NiT decidiram viver apenas com um cartão durante um dia inteiro. No fundo, decidiram ter uma #CashlessLife. Esta foi a experiência da Catarina Antunes.
Quando fico sem dinheiro na carteira, tenho o terrível hábito de me esquecer de levantar mais. No outro dia fui beber um café com um amigo e quando ia pagar, lá passei pela vergonha de dizer: “Desculpe lá, mas afinal não tenho dinheiro. Só percebi agora.” Segue-se aquela conversa do vou só “ali” levantar e volto já. O problema é que o tal “ali” — o destino mais visitado de Portugal — costuma ficar a 700 metros a pé. Desta vez, isso não foi um problema. O dono da cafetaria, que nem sequer me conhece, sorriu e disse-me que era por conta da casa. Sortes destas não acontecem todos os dias.
Decidi aceitar este desafio da NiT porque não gosto de andar com muito dinheiro na carteira. Nem sequer acho seguro. Convidei o meu namorado para, em conjunto, passarmos um dia inteiro sem notas, nem moedas. Comecei logo a pensar em mil e um problemas — como os transportes públicos, o lanche… Parecia tudo impossível. Como é que eu vou pagar coisas que custam cêntimos? Pronto, vamos lá tentar.
A verdade é que a experiência correu muito melhor do que eu esperava.
Saí de casa às 8h30, em Torres Vedras, e usei o meu passe, que é carregado mensalmente, para apanhar o autocarro que me traz todos os dias para o trabalho em Lisboa. Assim que chego à NiT e me preparo para atacar o meu precioso café matinal na pastelaria em frente do edifício, lembro-me que eles não aceitam cartão para despesas abaixo dos 5€. Que conveniente. Em vez de me concentrar no desastre da ausência de cafeína, pensei que esta seria uma boa oportunidade para adiantar o trabalho daquele dia.
Às 13 horas fiz a primeira pausa para almoçar: arroz de peixe feito pela mamã e que viajou mais de 40 quilómetros na minha bela marmita. Uma hora depois fui ter com o meu namorado João junto da estação do Metro no Campo Grande. Trabalho feito (é incrível o que conseguimos fazer quando não temos a desculpa do café para sair do escritório), tarde livre para visitar museus. Sim, museus — a sugestão foi do João, eu trocaria esta tarde cultural por umas belas horas deitada no sofá a ver séries da Netflix. O rapaz gosta destas coisas, o que posso eu fazer?
Quando chegamos ao Metro, depois de subir aquela escadaria enorme, compramos duas viagens nas máquinas com cartão. Super tranquilo de rápido. Cinco paragens em duas linhas depois, chegamos ao Museu Calouste Gulbenkian, perto de São Sebastião. Compramos dois bilhetes, 5€ cada um, com cartão para a exposição “Pós-Pop: Fora do Lugar Comum”, que reúne várias obras feitas em Portugal entre 1965 e 1975. Ele fica feliz, eu fico a olhar para o relógio no telemóvel durante 45 minutos.
De regresso à cidade dos vivos, voltamos para o Metro em direção ao Cais do Sodré. Objetivo: apanhar o eléctrico 15 para Alcântara, onde está o Museu da Carris. Que plano tão divertido. Meu Deus, sou mesmo boa namorada.
Chega o elétrico, chegam os problemas.
— Boa tarde. Posso pagar os bilhetes com um cartão de pagamento?
— Não, só com dinheiro. Se quiser pagar com cartão tem de ir a uma estação de Metro e carregar o passe Zapping que permite viajar em todos os transportes da Carris. Seria impensável termos um sistema de cartões em todos os transportes públicos.
Curioso, em Londres esse sistema existe — e está em todos os transportes públicos. Mas pronto, paciência. Voltámos ao Metro e para casa. Quando as coisas se tornam demasiado complicadas, não há cultura que valha. Desculpa, querido João.