Os donos do hotel são ingleses, por isso tinha de haver uma referência ao tradicional fish and chips. Na apresentação não tem nada a ver com o habitual, mas na boca fez todo o sentido. Compõe-se ainda com um pastel de bacalhau com queijo da serra, com uma apresentação peculiar, em forma de disco.
Um dos ingredientes novos a entrar foi o caranguejo de casca mole. Ainda o vimos vivo e a mexer-se na cozinha, mas à mesa chegou ponto a comer, sem deixarmos qualquer elemento — era todo para comer. Pegámos no caranguejo crocante e molhámos na sopa avermelhada preparada também o animal. Muito aromática. Era um trio de caranguejo já que foram servidos ainda um bao e uma sanduíche com alga nori, tudo com caranguejo.
A primeira vez que saímos do mar foi quando chegou o frango piri piri. Claro que não viria uma travessa de inox com uma salada de tomate ao lado, mas os sabores estavam lá todos, se bem que apresentados de forma muito criativa pelo chef Ricardo Costa.
A sugestão foi inspirada nas churrasqueiras portuguesas. É nos proposto começar com a sandes de frango com a pela crocante, a maionese de frango e a coxa de frango confitada, tudo à mão. Assim que terminamos, tiramos o prato de cima e chegamos à salada de tomate. É preparado com tomate confitado, manjericão e uma gelatina de tomate.
Sopa de caranguejo.
E depois de tanta coisa, parece que já vamos a meio, mas só agora é nos servido o primeiro prato: lírio. É simples a descrição no menu, mas bastante complexo o prato que nos chega. É em formato de peixe. Junta um gaspacho de pepino, espuma com o mesmo vegetal, pérolas geladas também com pepino feitas com nitrogénio.
Retirado o prato, é servida uma degustação de conservas, as tais que o chef nos mostrou na cozinha. É nos pedido que sigamos uma ordem e com uma pinça retiramos os vários pedaços. Temos berbigão, mexilhão, barriga de atum, bacalhau, enguia e ovas de bacalhau. Todos em conservas, alguns fumados outros só em picle e com diferentes graus de intensidade. Ao lado o chef apresenta um presunto de atum. “Ainda não está totalmente afinado, mas quisemos dar a provar.” Estavámos à espera de algo mais fumado e intenso, como uma muxama, mas revelou-se um sabor suave e interessante.
Continuamos no mar, agora com o choco. Chega uma tábua com dois polvos que não são para comer, apenas os pequenos snacks que estão dispostos nos tentáculos. São eles as puntilhitas de choco com morcela; o chouriço de choco e uma tempura de tinta de choco.
Lírio.
Seguiu-se a raia, um peixe por vezes algo descurado de menus, mas aqui muito bem trabalhado por Ricardo Costa. É uma sugestão inspirada nos pescadores e junta escabeche de fígados de raia, louro, salsa e vinagre. Segue-se a lampreia, outro ingrediente da época que aqui foi preparado de uma forma que até quem não gosta ficará fã, sem dúvida.
E a transição para o prato de carne, que ia fechar o menu antes das sobremesas, é feito com a beringela. É servida como se de um naco de carne se tratasse, mas é mesmo aparência. No sabor é óbvio o molho feito com borrego. Junta-se ainda caril, um canneloni de cogumelos, um parfait de caju, espuma de hibisco e trufa negra.
O chef andou pela zona da Bairrada à procura da melhor raça para o prato de leitão que quis trazer novamente para o menu do The Yeatman. O animal é cozinhado no restaurante de Vila Nova de Gaia e tem uma pele crocante que queremos trincar a toda a hora. A carne é super macia e saborosa. Por cima tem um toque a sal e ao lado um molho com leite de amêndoa. Tudo a combinar na perfeição.
Leitão.
Ainda havia espaço na mesa para as sobremesas? Tinha de haver. Logo quando olhámos para a ementa no inicio reparámos que estava escrito ovos moles. Não podíamos perder isto. O chef é natural de Aveiro, por isso são óbvias as referências que quis trazer para este menu de aniversário. Junta amêndoa ralada e é uma opção gelada preparada também com nitrogénio. Alguns restaurantes de onde o chef é natural, fazem uma versão desta sobremesa e é servida como doce da casa.
Antes da segunda dose de sobremesas, mais uma: tripas doces com chocolate. Outra referência à zona de Aveiro, aqui servida com um chocolate crocante. Nunca nos tinha passado pela cabeça comer um doce deste tipo num restaurante Michelin. Mas porque não? Nada contra, estava ótima e por nós punhamos o chef numa food truck a vender tripas junto ao Douro.
Depois sim, o toque final: um bolo de ananás dos Açores, com coco, sorbet de ananás e coco. É para acompanhar com um cocktail de matcha. Uma autêntica viagem ao arquipélago sem sairmos de Vila Nova de gaia.
Ovos moles de Gaia.
Este menu completo que provámos, e pelo qual nos maravilhamos, custa 180€ por pessoa. Claro que fazer esta refeição sem o acompanhamento de vinhos não é a mesma coisa, pelo o que sugerimos que o peça também. Há um pairing a 90€ e outro mais completo a 180€, com seis vinhos que cinco regiões do País e que dão mais valor a todos os pratos que se provam. É do caso do Ilha do Pico Terrantez, de 2018, do Quinta do Almeal Loureiro de 2005, ou o Pape 2012, do Dão.
O hotel faz 10 anos, o chef 20 de carreira e 40 de vida. Faltava a década de 30 para compor em beleza ele capítulo dos anos. Está nas bebidas: um Taylor’s 30 anos.
Não queríamos sair dali e optámos no final por uma infusão só para a refeição se alongar por mais uns minutos — o café é sempre mais rápido.
As reservas para o The Yeatman podem ser feitas através do site.