Assim foi. Começou a produzir em casa e as encomendas eram feitas online. O primeiro cliente que teve foi o restaurante Cataplana, em Campo de Ourique. “Compraram duas tortas para experimentar e depois passaram a quatro ou seis por semana. Ainda hoje vendo para eles.”
Em 2015 abriu a primeira fábrica, na Graça, que rapidamente se tornou pequena. Está agora na segunda, para a qual comprou um forno que coze 16 tortas de cada vez — foi com ele que vieram as formas de ovos de chocolate que, na altura, pareciam não ter qualquer utilidade.
Uma torta de laranja (com cerca de 1,5 quilos) custa 20€ e vende-se sobretudo à unidade, apesar de também existir à fatia e com recheio de chocolate ou Nutella. Só usa produtos nacionais e as laranjas vêm do Algarve, o que nem sempre ajuda na margem de lucro.
“Às vezes estão tão caras que não ganho praticamente nada”, explica. Ainda assim, sabe que é por isso que os clientes se tornam fiéis.
Não costuma ter estagiários porque eles passariam 90% a fazer tortas de laranja
Tem propostas para exportar para vários pontos do País mas o controlo de qualidade é um dos motivos pelos quais ainda não expandiu mais a marca. “Uma torta dura dez dias mas e se o restaurante a vender duas semanas depois? O produto já não vai estar bom e é o meu nome que lá está. Tem de haver uma confiança muito grande.”
Essa relação existe com a cadeia Tappas Caffé (de francesinhas em forno a lenha), que já tinha a sobremesa em Lisboa e desde 3 de abril a disponibiliza nos espaços do Porto e arredores.
Pasteleiro como o pai
A receita foi herdada do pai, António, também pasteleiro. Foi com ele que começou a trabalhar com apenas 12 anos. Aos 16 tirou um curso e o primeiro estágio que fez foi na Costa da Caparica mas, mesmo assim, não queria ser pasteleiro.
“Não posso dizer que sempre me imaginei a fazer isto, pensava que podia ser um Luís Figo, como acho que todos os miúdos a dada altura quiseram ser futebolistas. Mas o meu pai citava o chefe dele, que já dizia que até de um pau de vassoura se faz um pasteleiro. Por isso, ou ia estudar ou trabalhar. Escolhi trabalhar”, recorda.
No entanto, António Costa morreu inesperadamente, na sequência de uma broncopneumonia, quando o filho tinha 18 anos e ele ficou completamente perdido. Fez uma mala e meteu-se num avião a caminho de Inglaterra.
“Não tinha trabalho, não tinha casa, não sabia o que me esperava. Passei uma semana na rua até que um senhor italiano, chamava-se Consolato, me acolheu e me arranjou trabalho numa pastelaria. Não é irónico?”
Regressou a Portugal um ano e meio depois e foi para a pastelaria Nilo, em Benfica, onde o próprio pai tinha começado a trabalhar aos 18 anos. Não disse a ninguém de quem era filho, muito menos ao “chefe Sobral”, como lhe chama carinhosamente e que era o ídolo de António Costa.
“Uma vez eles estavam a falar do meu pai e disseram: ‘Ó Marco, devias era ter conhecido o Toni Maluco.’ Era assim que lhe chamavam. Eu contei que era meu pai e nesse dia ganhei um amigo e quatro inimigos. O chefe Sobral fazia questão de me ensinar tudo, aprendi muito lá.”
Avó estrela do Instagram, festivais e um livro novo
Não passa um dia sem pensar no pai. Sabe que ele estaria orgulhoso mas que teria também muito para lhe ensinar ainda. “Era uma máquina de trabalho”, recorda.
Ainda assim, conta muitas vezes na fábrica com a ajuda da mãe, Esperança Oliveira, e da avó, Alcina Silva. Esta última virou, aos 75 anos, uma espécie de estrela das redes sociais — só no Instagram conseguiu 22 mil seguidores em pouco mais de três meses. “Ofereci-lhe um telemóvel no Natal e criámos conta por brincadeira. Agora até há polícias que querem tirar fotos com ela”, conta Marco.
Em dias normais começa a trabalhar às seis da manhã e nunca sai antes das 17 horas. No início fazia entregas mas atualmente já não consegue assegurar tudo e canaliza as encomendas e os produtos para a loja do Amoreiras Shopping Center, onde trabalham quatro pessoas, incluindo a irmã, Soraia.
Quando era miúdo, a família não tinha muito dinheiro. Por isso, agora que o projeto que criou corre bem, quer que ele inclua todos os membros. Se tira férias, o que é raro, toda a produção pára, excepto as tortas de laranja, asseguradas pela mãe. Já lhe deu algumas preocupações, admite, incluindo no dia em que saiu de casa pela segunda ocasião sem explicações e só com uma mala, desta vez para integrar a “Casa dos Segredos”.
“Ela achava que eu ia ser ator pornográfico ou qualquer coisa do género [risos]. Só lhe disse: ‘Não te preocupes, vou trazer dinheiro para casa.’”
Os pais separaram-se quando Marco Costa tinha seis anos e, apesar de algumas decisões mais precipitadas, sempre se sentiu “o homem da família”, responsável por contribuir com o que podia.
No Natal de 2017 foi uma loucura com o Bolo Rei de maçã. Pelas mãos de Marco passaram três toneladas do fruto
O reality show da TVI deu-lhe protagonismo — era um dos concorrentes mais adorados pelo público — mas, passados sete anos, o estigma de ter passado por um concurso do género continua presente.
“Há muitas pessoas que pensam que tudo o que faço é cunha. Lancei um livro com cunha da Teresa Guilherme, tenho uma rubrica no programa da Fátima Lopes [“A Tarde é Sua”, na TVI] com cunha da Teresa Guilherme.”
Os números provam o contrário. “Receitas com Segredo”, editado pela Oficina do Livro, vai na 14.º edição e conta com 50 mil cópias. “Foi o livro gastronómico mais vendido em 2017 e também o mais vendido da minha editora nesse ano”, conta.
Um segundo volume está nos planos mas a pressão é agora muito maior. Da primeira vez escreveu um livro porque queria e porque alguém duvidou de que seria capaz. Sempre que isso acontece, ele tem de provar o contrário. Foi igual com o culturismo, modalidade na qual chegou a ser campeão nacional em 2015.
“Foi por causa do meu padrinho de casamento. Disse que eu não era capaz e não há nada pior do que dizerem-me isso”, garante.
Desistiu passados três anos. “Se continuasse, a minha mulher punha-me fora de casa [risos].”
Recebe inúmeras mensagens de pessoas que se oferecem para trabalhar com ele, até de estagiários que querem aprender, mas apesar de adorar ensinar, sabe que isso seria ingrato. “Iam passar 90% do tempo a fazer tortas de laranja, não iam aprender nada.”
No Natal as encomendas são tantas que se abre uma exceção e há um funcionário extra para ajudar. Em 2017 foi o Bolo Rei de maçã que mais vendeu — Marco Costa nem sabe ao certo o número mas recorda que pelas mãos lhe passaram três toneladas do fruto.
A maior encomenda que teve chegou da Deloitte: 100 Bolos Rei de um quilo, entre os tradicionais, de Nutella, maçã e Bolo Rainha. Atualmente os bolos de chocolate Kinder ou Snickers (25€ o quilo) também são dos mais pedidos.

Os elogios são merecidos: é fofa, húmida e deliciosa.
“Snickers é o meu chocolate favorito e tinha de inventar um bolo com ele”, revela à NiT. Foi testando para apurar a receita e é tão simples quanto isso. No Dia dos Namorados criou corações que achou que nem ia vender. Voaram 150 a 14€ e teriam desaparecido outros tantos se ele tivesse tido tempo para fazê-los. O verão será, provavelmente, uma época mais fraca nas vendas mas o pasteleiro pretende regressar a uma fórmula que conhece bem e que sabe que resulta: feiras e festivais.
Gostava de abrir mais espaços, além daquele que tem nas Amoreiras, mas diz que ainda é cedo.
“A loja só vai fazer um ano em outubro. Ainda não temos termos de comparação, precisamos de ir percebendo o que funciona ou não.”
Os Restauradores, em pleno centro de Lisboa, seria um dos seus locais de sonho para ver Receitas com Segredo: “Mesmo à burguês [risos].”
Até lá, o trabalho não pára na fábrica de Casal de Cambra. De quinta, 5 de abril, para sexta-feira, 6, passou outra noite sem dormir — desta vez porque conduziu mais de 1200 quilómetros para ver o jogo Atlético de Madrid – Sporting (2-0) da Liga Europa. Às seis da manhã já estava novamente de avental e touca na cabeça, a produzir e rechear dezenas de ovos de chocolate para encher a vitrine de Receitas com Segredo. Curiosamente, Marco Costa faz tudo menos guardar fórmulas secretas.
“Partilho todas as minhas receitas. Se as pessoas guardam segredos, arriscam-se a morrer com eles.”